segunda-feira, 23 de abril de 2012

Apocalipse de Coelhos Zumbis de Willian Eloy, parte I


Dez anos atrás  

Deitados dentro de uma barraca de montar um casal de biólogos apreciava o céu estrelado quase que totalmente escondido atrás das enormes árvores. O céu dava a impressão de que os dois estavam dentro de uma cúpula oculta por copas e mais copas de árvores. 
-Josh, esse lugar é maravilhoso. Deveríamos ter vindo aqui antes. – Exultante, depois de dois dias de pesquisas haviam descoberto duas novas espécies, uma de lagarto e outra de borboleta. 
-Sim, não consigo e nem quero discordar. Só me preocupo um pouco com a distância que estamos da população, somos os primeiros a adentrar tanto essas matas. – Josh sempre fora lógica e um tanto pessimista, era uma ótima pessoa, com um coração enorme. Mas acreditava que o pior estava sempre rondando. 
-Nós trouxemos todo o material necessário, repelentes, kit de primeiros socorros, comida suficiente para mais duas semanas. Estamos ótimos e eu adoro estar aqui, longe dos barulhos da cidade grande. 
-Você tem razão, meu amor. Eu deveria aproveitar mais, afinal, quando teremos a chance de sermos pagos para explorar um lugar tão maravilhoso?
Os dois já estavam a uma semana se embreando na mata fechada do coração verde do Brasil, haviam visto vários animais que só conheciam por livros e fotos, tiveram um encontro perigoso com uma onça, mas o fogo das fogueiras sempre as mantinha bem afastadas, assim como os outros animais caçadores que vagavam livremente pelo verde quase infinito da floresta. 
Crak, crak, crak... 
-Ouviu isso, Deny?
-Ouvi, deve ser apenas algum animal noturno caçando, a fogueira vai manter os perigosos afastados daqui. 
-Eu vou dar uma olhada só para se certificar. 
Deny sabia que nada que dissesse o faria mudar de ideia, então o deixou ir sem rodeios. 
Josh abriu e fechou rapidamente o zíper da barraca por conta dos mosquitos deixando somente a segunda camada aberta. E procurou apurar os ouvidos para escutar os sons e descobrir de onde havia vindo aquele som. 
Crak, crak... 
Dessa vez o som foi bem mais alto e próximo, até Deny se aproximou da entrada da barraca para ver o que estava acontecendo. 
Mais à frente um som de grito quase gutural cortou a mata. Josh pegou uma das peças de madeira bruta sobressalentes da barraca e avançou a empunhando como um bastão. À sua volta podia quase sentir que o farfalhar de folhas era devido ao correr de animais. 
Sabia que deveria ter feito uma fogueira maior, pensou preocupado com que animal poderia estar ali. 
Outro crak e de trás de uma das árvores mais próximas saiu um homem. 
De baixa estatura e cabelo liso, parecia um índio, as únicas coisas estranhas eram o olho direito que parecia muito vermelho e um braço que depois do cotovelo era apenas ossos e tendões, sem pele, com um sangue ainda escorrendo. 
Deny gritou ao ver a cena. Meu Deus, pensou Josh, que logo solto o bastão e correu para ajudar o índio. 
Sua roupa era apenas uma toga e um cordão feito de folhas marrons, de tinta vermelha desenhos enfeitavam o rosto e o peito. O índio estava quase sem consciência, disse meia dúzia de palavras de forma cansada e preocupada. Fechou o olho castanho, mas manteve o vermelho aberto. 
Josh reparou melhor naquele estranho olho e viu que não parecia irritação a íris era vermelha, de um vermelho vivo que parecia se mover por vontade própria. 
Josh sentiu uma mão agarrar seu ombro e se virou de forma brusca e viu que era só Deny com os olhos esbugalhados e tremendo. 
De repente outra mão o toca, dessa vez é uma mão forte e calejada. Dessa vez a mão era o índio que parecia ter desfalecido, a mão que era somente osso e tendão que pressionava seu pescoço. 
Deny gritou novamente, correu para pegar a peça de madeira que Josh havia soltado e voltou correndo para ajudar. Josh naquele momento lutava freneticamente contra um índio aparentemente morto, somente seu braço se apertava contra seu pescoço e aquele olho vermelho o observava como se encontrasse prazer naquela cena. 
Não demorou muito até que um pedaço de madeira fizesse que um braço descarnado se quebrasse e Josh se afastasse, ainda de frente para aquele ser que não poderia ser humano. Levantou-se e tomou o pedaço de madeira da mão de Deny. 
-Rápido, Deny, pegue o repelente aerossol. – Deny nem perguntou o motivo, correu para pegá-lo enquanto Josh ficava parado tossindo e esfregando a garganta em frente à entrada da barraca e esticava a ponta da madeira na fogueira. 
Quando Deny chegou ele jogou repelente na ponta da madeira que ainda não havia pegado fogo e o colocou novamente no fogo que o lambeu e se fixou na ponta da madeira. 
-O que era aquilo, Josh? – Deny estava em estado de choque, lágrimas escorriam pela sua bochecha. 
-Não sei, mas eu tenho quase certeza de que não era a única. Eu ouvi mais sons na mata. Segure isso. – E entregou a madeira em chamas para Deny, que não entendeu muito bem – Eu vou dar uma olhada, mas não irei muito longe, prometo. 
-Por favor, não vá! – Deny segurou firme seu braço enquanto gritava chorando para que ele não fosse. 
-Não vou longe, só vou olhar e volto rápido. 
Josh entrou na barraca, soltou um pedaço de madeira e com o repelente pôs fogo e andou em direção à mata, com Deny ainda insistindo para que não fosse. 
Ouviu farfalhar a sua direta e andou até lá de forma cautelosa, pronto para acertar quem estivesse por lá. Ouviu um som atrás de si e se virou pronto para abater quem fosse, mas parou bruscamente, era só Deny. 
-Eu vou com você. 
Andaram alguns minutos juntos na direção de onde o índio havia saído. Não haviam se afastado muito, quando viram mais dois índios bem parecidos com aquele que morrera. Estavam com feições agressivas e, no corpo, os mesmos desenhos do que os atacou. Mas algo estava diferente, eles estavam ofegantes demais e avançaram de forma a atacar em dupla, apesar de não terem nenhum tipo de arma. 
Foram fechando um círculo em volta do casal, que ficaram de costas um para o outro segurando firmemente as madeiras incendiadas. Os índios pararam quase no mesmo instante e os quatro olharam ao mesmo tempo quando um outro índio surgiu da mata. 
Os dois índios ficaram tensos enquanto o recém-aparecido andava na direção deles. Um deles tomou a madeira de Deny e correu na direção dele. Antes mesmo de chegar perto já havia saltado pronto para descer o bastão com toda força no índio, que Josh reparou nesse momento ter os olhos vermelhos, os dois. 
A pancada foi violenta e acertou em cheio o ombro daquele estranho ser, o ombro se deslocou e todos ouviram o som de ossos quebrando. No lugar que antes estava o ombro, agora só havia uma irregularidade profunda. Mas isso não pareceu surpreender o estranho, que puxou com força o bastão e antes que seu atacante pudesse se defender o fez perfurar sua barriga. 
E ali morreu mais um indígena, Josh e Deny estavam sem entender nada, o mundo ficara louco, que tipo de homens eram esses? Isso não poderia existir, só poderiam estar em um pesadelo. 

O outro índio que ainda estava perto de Josh estendeu a mão para ele pedindo a madeira, Josh vendo que o índio com o ombro quebrado vinha andando o entregou, confiando naquele que a pouco estava o cercando. Bem, ao menos seus olhos eram castanhos sem sinal de vermelho. 
Automaticamente o índio brandiu contra a cabeça do outro o derrubando, Josh aproveitou para apanhar o outro pedaço de madeira e ajudou o índio a destrinchar o indígena caído, que mesmo com vários ossos quebrados ainda se movia tentando agarrá-los. 
Somente depois de muito bater o índio parou de se mexer e os dois pararam os golpes, se olharam nos olhos e fizeram um tipo de comunicação. Josh entendeu que existiam índios de verdade e outras coisas que se passavam por índios. 
-Josh – Falou o próprio apontando para si mesmo. 
-Tupia – Disse o índio fazendo o mesmo gesto. 
Era certo que não falavam o mesmo idioma, aquele índio provavelmente fazia parte de uma tribo ainda desconhecida da civilização. 
Josh fez um sinal a Tupia para que lhe acompanhasse, e ele o seguiu. Josh abraçou Deny que não dissera uma palavra desde a aparição dos índios, ela estava tremendo mais forte e não estava com os olhos fixos em nenhum ponto. Josh a segurou pelo braço e a puxou, ela foi facilmente acompanhando os passos dele. Tupia olhou bem nos olhos de Josh e depois nos olhos de Deny e esperou enquanto eles tomavam a frente. 
O caminho de volta foi bem mais demorado, pois se perderam duas vezes, mas chegaram à clareira onde haviam montado sua barraca. 
A fogueira ainda crepitava como se aquela fosse uma madrugada normal, ao se aproximarem, mas não encontraram o índio que os atacara mais cedo. A barraca estava virada e com algumas partes quebradas. 
Josh correu para dentro, pegou todos os itens que poderia carregar, desde remédios a relatórios. Tomou nas mãos a bússola, encheu uma mochila com alimentos e a pôs sobre suas costas e a mais leve com os outros itens nas costas de Deny, que ainda não dera sinal de lucidez. 
O dia começou a tomar uma cor azulada, alguns raios preguiçosos cortavam uma ou outra árvore causando um efeito lindo, quando insetos passavam voando por elas. 
Eles estavam tomando rumo para voltar à civilização, Josh tentou explicar isso para Tupia, que aparentemente entendeu. Tupia pegou uns papéis no chão e desenhou casinhas em chamas. Josh deduziu que as casas onde ele habitava haviam sido destruídas, então desenhou os três andando juntos e apontou para onde iriam. Tupia disse algumas palavras que Josh não conhecia e apontou para a mochila de Deny.  
Depois de vesti-lo com algumas roupas mais apropriadas pôs sobre ele a mochila de Deny e foram os três caminhando para o fim daquele pesadelo.

Willian Eloy

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